POR QUE CONTINUAR INVESTINDO EM MOOCS?
Os cursos on-line abertos e massivos, conhecidos pela sigla em inglês MOOC (Massive Open Online Course) foram criados para oferecer aulas gratuitas a um grande número de pessoas com o objetivo de ampliar o acesso ao conhecimento.

Eles surgiram em 2008, quando os professores George Siemens da Universidade de Manitoba no Canadá e Stephan Downes decidiram abrir uma disciplina sobre conhecimento conectado para alunos de fora da universidade. Ao final, foram cerca de dois mil inscritos e o termo acabou sendo cunhado, devido ao seu caráter massivo e aberto. Inicialmente, a ideia dos MOOCs estava muito ligada aos princípios dos Recursos Educacionais Abertos, que são materiais de ensino, aprendizado e pesquisa disponibilizados em diferentes suportes e mídias, sob domínio público ou licenciados de maneira aberta para que sejam utilizados ou adaptados por qualquer pessoa.

Conforme a ideia se popularizou, o modelo começou a ser adaptado e ajustado para diferentes demandas. Em pouco tempo, as universidades mais bem conceituadas do mundo, como Harvard, Princeton e MIT, já estavam desenvolvendo seus próprios MOOCs.

Em 2011, o empreendedor e professor da Universidade de Stanford, Sebastian Thrun, e mais dois amigos, fundaram a Udacity, uma organização educacional criada para oferecer cursos universitários gratuitamente ou com preços bastante acessíveis para pessoas de todo o mundo. Apesar de admitir dificuldades, como problemas de acesso em bairros pobres, Thrun defendia os MOOCs como o modelo de educação do futuro.

Em outubro do ano seguinte, a revista americana Time publicou uma reportagem de capa sobre educação superior e destacou os cursos abertos como opção de acesso gratuito às universidades; em 2015, a mesma revista publicou mais uma matéria exaltando o modelo de treinamento vocacional criado pela Udacity como a fórmula de sucesso para capacitar milhões de pessoas em habilidades técnicas.

No entanto, a “onda” passou e em 2017, Clarissa Shen, vice-presidente da Udacity, admitiu que os MOOCs estavam acabados: “Nossa missão é trazer educação relevante para que as pessoas cresçam em suas carreiras e em suas atividades socioeconômicas, e os cursos on-line abertos e massivos não são o caminho.

Esta opinião não é unânime no meio acadêmico. O professor de empreendedorismo, Luis Felipe Carvalho, pensa diferente. Enquanto escrevia seu doutorado sobre o tema, ele resolveu lançar, com o apoio da Coordenação Central de Educação a Distância e da Coordenação Central de Extensão da PUC-Rio, um curso on-line aberto sobre criptomoedas. O resultado surpreendeu muita gente. Na entrevista a seguir, Luis Felipe explica porque os MOOCs ainda são um bom investimento para os alunos que se matriculam e para as instituições que os oferecem.

De onde surgiu a ideia de oferecer um MOOC sobre criptomoedas na PUC-Rio?
Trabalho com a modalidade de educação a distância há bastante tempo e desde o início do ano de 2016 venho pesquisando e dando aula no segmento de Blockchain e Moedas Digitais, ou criptomoedas como são mais comumente conhecidas. Como estava escrevendo minha tese de doutorado sobre MOOCs, esta foi uma boa oportunidade de aproveitar a experiência nos dois campos para desenvolver este curso aberto e com abrangência nacional.

Como foi a elaboração do curso?
O curso que oferecemos foi inspirado em um Mooc da Universidade de Nicósia, no Chipre. Esta universidade conta com um dos pesquisadores mais proeminentes na área e eles desenvolveram um mestrado online nesta área de Blockchain e Moedas Digitais. O primeiro módulo do curso é um MOOC introdutório no tópico, baseado em videoaulas e outros recursos a partir da plataforma Moodle. Aqui, fizemos algo semelhante: usamos o ambiente virtual de aprendizagem da PUC-Rio e dividimos o conteúdo em módulos, usando basicamente três recursos: videoaulas, avaliação e fóruns de discussão. Além disso, oferecemos um conteúdo que não se acha facilmente na internet. A inscrição era aberta para todos e o curso durou quatro semanas. Optamos por fazer uma avaliação com questionários e quem alcançasse uma determinada nota era aprovado e poderia pedir um certificado da universidade. Este certificado tinha um custo, para cobrir o processo de produção e envio pelos correios, entretanto, a emissão do certificado era opcional. O aluno podia cursar todo o curso e realizar as avaliações sem a necessidade de solicitação deste certificado.

Este foi o primeiro curso deste tipo realizado pela PUC-Rio? Houve muitos interessados?
De fato, foi o primeiro curso massivo, on-line e aberto da universidade. Tivemos 1.200 pessoas de todo o Brasil inscritas e isso porque tivemos que parar as inscrições em três dias, devido à enorme procura. A divulgação foi bastante simples, produzimos um vídeo explicando como seria o curso e colocamos em um grupo do Facebook de pessoas interessadas no assunto. É preciso lembrar que aquele era um bom momento para falar sobre o tema, as criptomoedas eram notícia e despertavam a curiosidade de muita gente. Ainda assim, ficamos surpresos com a quantidade de inscrições.

Do total de inscritos, houve muita desistência?
Sim, houve, mas esta é uma característica dos cursos abertos. No nosso caso, o número de pessoas que participaram de todas as aulas foi até alto em relação ao que ocorre normalmente. Dos 1.200 inscritos, cerca de 500 apenas entraram no ambiente, mas não foram alunos ativos. O restante participou do curso, mas não necessariamente realizou os exames de avaliação ou foi aprovado. Do total de alunos do curso, cerca de 20% concluíram e foram aprovados. Comparando com outros cursos MOOC que disponibilizaram os resultados, este percentual é relativamente alto. A média de conclusão e aprovação gira em torno de 7% do total de alunos inscritos. Acredito que tivemos um aproveitamento superior por causa do idioma. Geralmente Moocs são cursos globais, em inglês, e há um público que não é fluente na língua e desiste. Nossos alunos eram brasileiros, havia apenas cinco pessoas que falavam espanhol. Por isso, defendo Moocs regionais. Até por uma questão cultural, os cursos abertos e livres não precisam ser necessariamente globais. Além disso tem a questão da divulgação da instituição de ensino. Um efeito colateral positivo é que muitas pessoas têm acesso à instituição e acredito que isso tenha um efeito positivo.

Você disse que usou o recurso de videoaulas? Como foi feita esta produção?
Optamos por um formato bem trivial. As aulas foram criadas utilizando um padrão de apresentações de Power Point narradas. Éramos três professores e criamos roteiros para os vídeos, assim, não corríamos o risco de divagar muito sobre determinado assunto e o roteiro facilitava também a edição. Este é um formato rápido e bem legal. Os vídeos precisam ser curtos e ao final descobrimos que o tempo médio das visualizações foi de 7 minutos por vídeo. Tínhamos uma apresentação padrão, simples de fazer e gravamos por conta própria, o que nos deu muita agilidade.

Quais as vantagens e quais as desvantagens em trabalhar com este tipo de recurso?
Uma vantagem é a possibilidade de trabalhar com roteiro, esta, aliás, é uma ótima dica e faz muita diferença, pois é um modelo facilmente replicável, fácil de implementar por outros professores e torna a aula mais dinâmica. Uma desvantagem, por exemplo, é a desenvoltura dos professores. É preciso treino para que o aluno não perceba que há um roteiro sendo lido. Nosso desempenho neste quesito foi bom e os alunos ficaram satisfeitos, mas percebemos que alguns vídeos podem ser melhorados e isso vai fazer a experiência da aula ainda mais interessante.

Outra vantagem, que já citei, é a possibilidade de produzir vídeos caseiros, o que dá muita agilidade. Se fizéssemos em estúdio, seria muito mais custoso, mais trabalhoso e mais demorado. Hoje, com os recursos tecnológicos que temos, é possível fazer vídeos excelentes, com um som ótimo e uma qualidade final excelente, sem que isso deprecie a imagem da universidade que oferece o curso. Utilizamos microfones de lapela com softwares de gravação no próprio smartphone. Esse recurso combinado com um ambiente silencioso de gravação proporciona uma experiência muito próxima da gravação em um estúdio. Com relação à filmagem, nosso modelo utilizava basicamente a gravação da tela e isso evita lidar com os dois maiores desafios de filmagem que são a iluminação e a capacidade de atuação do professor perante às câmeras. Questiono se o investimento nestes dois atributos realmente agrega tanto valor assim aos vídeos.

Então, é possível fazer um Mooc com pouco dinheiro sem perder a qualidade?
Eu acredito que sim. É claro que há universidades que investem muito dinheiro na produção de Moocs e fazem produções verdadeiramente cinematográficas. Mas não acho que isto seja necessário. Além disso, o conteúdo muda muito rápido. Se você não tem verba suficiente, nem adianta investir em altas produções e ter que mudar tudo logo em seguida porque o conteúdo vai ficar “velho”. Na verdade, tudo depende do propósito a ser alcançado. É possível, sim, fazer uma produção barata e, ainda assim, oferecer um ótimo curso e ter bons retornos. No nosso caso, o custo foi principalmente administrativo, além do tempo de dedicação dos professores.

Recentemente, houve uma enxurrada de críticas aos Moocs, mas na sua opinião, eles ainda são importantes.

Por que continuar investindo neste formato de curso?
Há uma série de razões para continuar investindo em Moocs. Ainda existe uma demanda muito grande por cursos abertos e eles se tornam uma ferramenta de divulgação muito boa para as instituições que os oferecem. Neste curso de criptomoedas, por exemplo, muita gente ficou verdadeiramente agradecida à PUC pela oportunidade – isso ficou muito explícito no fórum de apresentação que promovemos logo no início do curso. Um MOOC dá visibilidade à universidade e leva a marca para longe, por isso, é um modelo interessante de divulgação e de extensão da missão universitária. Esta é uma prática que vem se expandindo em todo mundo a partir de renomadas instituições de ensino, como Harvard e MIT. Um outro aspecto a ser mencionado é a geração de dados em larga escala. Mantendo os princípios das boas práticas de pesquisa acadêmica e o anonimato dos participantes, um curso MOOC tem o potencial de gerar uma quantidade enorme de dados que podem servir para a evolução das pesquisas no campo de EAD. Há planilhas sobre cursos abertos e livres de Harvard que mostram a quantidade de dados gerados a partir dos Moocs. Eles nos ajudam a entender melhor as práticas de educação online. Esses dados não aparecem em cursos semipresenciais, por exemplo. Apenas nos Moocs, simplesmente pela quantidade de alunos, podemos enxergar certos tipos de dados.

Quais são os planos para o futuro?
Quero fazer mais cursos abertos e livres on-line aqui na PUC-Rio. Houve uma época em que disseram que os Moocs eram a salvação do mundo da educação, depois disseram que não servia para nada. É normal que as tecnologias tenham este perfil: alcançam um sucesso enorme, passam por um momento de queda e depois ocorre uma estabilização. Acredito que estamos no período de estabilização dos Moocs e defendo que temos que explorar este espaço, pois é uma ferramenta muito útil. Meu objetivo é oferecer mais um curso de criptomoedas este ano, talvez até ter duas turmas, mas temos que ver como será viabilizado. Mas a equipe envolvida no primeiro curso ficou bastante animada e acredito que as perspectivas são boas para investir mais nesta área.