BOAS PRÁTICAS – RETROSPECTIVA PUC-RIO
Nesta edição, preparamos uma matéria especial sobre boas práticas no mundo da educação com enfoque no uso da tecnologia e como estas práticas colaboram para o desenvolvimento do conhecimento na era digital.
Percebemos, no entanto, que este já é um tema recorrente da revista Asas Ead, afinal, desde o seu lançamento, já foram publicadas diversas matérias e entrevistas com professores da universidade que, através do ambiente virtual de aprendizagem, investem em práticas inovadoras de ensino e aprendizagem. Por isso, decidimos fazer uma reportagem especial no melhor estilo retrospectiva. A seguir, apresentamos alguns dos projetos educacionais que fizeram grande sucesso na PUC-Rio.
Oficina virtual para prova da OAB
Na 9ª edição da revista Asas, mostramos o trabalho realizado em parceria com o Departamento de Direito sobre as oficinas virtuais que preparam os alunos para a prova da OAB.
Após a conclusão do curso universitário, todos os bacharéis em Direito precisam ser aprovados no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil para exercer a profissão. Obrigatória por lei, a prova é realizada três vezes por ano. Em 2006, o Departamento de Direito da PUC-Rio criou um simulado deste exame com o objetivo de preparar os estudantes para a primeira fase da prova, de múltipla escolha. A dificuldade dos alunos em acertar as questões do simulado fez com que, em 2012, o Departamento criasse uma oficina preparatória para o simulado. No ano seguinte, estas atividades passaram a ser obrigatórias a todos os estudantes de Direito e, em agosto de 2013, por decisão da Comissão Geral do Departamento de Direito, a oficina passou a ser virtual.
A professora Virgínia Totti Guimarães explica o motivo da criação do simulado e da oficina: “os alunos da PUC-Rio estavam com resultados ruins na prova da OAB e isso era uma preocupação para a universidade. Quando criamos o simulado, nosso objetivo era ajudar os estudantes para que obtivessem resultados melhores”.
A oficina virtual é um teste que os alunos realizam no ambiente de aprendizagem on-line da universidade. São questões de múltipla escolha, exatamente como na primeira fase do exame da OAB e foram elaboradas pelos professores da PUC-Rio que usaram questões de provas antigas da OAB. Este teste pode ser feito em qualquer lugar com computador e acesso à internet. São três blocos de prova com dez questões de cada tema. É permitido fazer a oficina quantas vezes quiser dentro do cronograma daquele período. Já o simulado é realizado presencialmente, na universidade, e é exatamente igual ao exame da Ordem.
A opção pelo ambiente virtual facilitou bastante a vida dos alunos que passaram a ter flexibilidade de horário, o que antes não existia. Além disso, explica Virgínia, “eles têm facilidade em usar o ambiente virtual, conhecem bem este universo e estão cada vez mais acostumados a fazer cursos on-line”.
O resultado dos alunos que realizam o exame da OAB melhorou desde que o simulado se tornou obrigatório: “Nossos alunos obtiveram resultados muito melhores na primeira fase dos exames, que é exatamente a fase das questões de múltipla escolha. Aliás, muitos formandos pedem para ter acesso à oficina novamente para adquirir prática para a prova da OAB. Isso, para nós, é um bom sinal porque significa que a oficina é uma ajuda útil e esse é o nosso objetivo”, diz a professora.
Novas formas de praticar a leitura
Em 2016, a professora Danusa Depes Portas ministrou o curso “Práticas de Leitura” para uma turma de calouros e decidiu utilizar o ambiente virtual de aprendizagem como uma personagem constante em suas aulas. Para ela, as tecnologias abrem a possibilidade de novas descobertas: “É um mundo novo que devemos explorar porque há ali milhões de possibilidades”.
Na 8ª edição da revista Asas, a professora falou sobre a possibilidade de peregrinar pelo espaço virtual como um verdadeiro desafio, mas também como um presente, e explicou que, inicialmente, os alunos ficaram assustados com a proposta, mas a fase de inquietação passou rapidamente: “Houve um momento de tensão porque eles pensaram que haveria uma vigilância constante, afinal, sou uma figura institucional e eles pensaram que, com o Moodle, eu assumiria a postura de uma espécie de big brother que olha tudo. Evidentemente, não é nada disso e eu consegui quebrar o medo da figura institucional”.
Danusa conta que foi preciso passar por uma fase de adaptação, mas depois desse período, todos entraram rapidamente no clima do Moodle e o usaram intensamente. A resposta foi tão boa que as aulas se estenderam para fora da sala. Não era raro que ela tivesse que responder mensagens de madrugada, por exemplo, mas apesar do trabalho, o resultado foi surpreendente: “Com certeza é uma forma que dá mais trabalho; por outro lado, dá mais resultados. Os alunos ganham muita autonomia. No sistema tradicional, isso demora muito tempo para acontecer porque os estudantes não se sentem autorizados a fazer certas conexões. Esse formato de curso permite que eles abusem mais, no bom sentido; sabem que podem estabelecer relações aparentemente desconexas e não serão ‘punidos’ por isso. Eles saem de um lugar de conforto e passam a acessar outros conhecimentos quando trabalham no ambiente virtual. Isso acontece com alunos que, às vezes, em sala, quase não participam. Há o caso de uma aluna que ficava imóvel na sala de aula e no Moodle, se transformava. Se eu não usasse o ambiente, pensaria se tratar de uma pessoa desinteressada.
A grande novidade proposta por Danusa foi utilizar o ambiente virtual durante as aulas, em sala, mas o ambiente não foi usado como uma simples substituição do quadro negro, ao contrário, foi uma estratégia para falar do pensamento que cria rede.
“Usei o ambiente como um contracampo que intensifica o aprendizado. Existe uma assimetria, reafirmada constantemente no campo institucional, que eu tento romper quando uso o Moodle. O que faço é estabelecer uma parceria no lugar dessa assimetria. Os alunos têm liberdade para se expressar, para ler o que está além da bibliografia do curso. Claro que respeito uma ementa que já estava definida antes, mas trouxe uma proposta nova. O resultado foi ótimo, esses estudantes se desenvolveram de forma incrível e leram textos trabalhados no mestrado.
História a distância
A professora do Departamento de História da PUC-Rio, Eunícia Barros Barcelos Fernandes, utilizou durante bastante tempo o ambiente virtual de aprendizagem em seus cursos. Na 7ª edição da revista Asas, ela disse que utilizar novas tecnologias e explorar novas práticas são fundamentais para os futuros profissionais da área. Na entrevista, a professora contou como a tecnologia se tornou uma aliada no processo de ensino e aprendizagem de História.
Para Eunícia, “estar em sala de aula é uma delícia e tem uma ação e reação imediata, mas ali não há obrigatoriedade de participação de todos os alunos, pois se pode ficar em silêncio; mas como no ensino virtual o instrumento é a escrita, o ‘estar em aula’ exige a participação: um aluno que ficaria em silêncio numa aula presencial acaba interagindo. Conseguimos, assim, a totalidade de intervenções de alunos participantes e temos uma qualificação do processo de escrita”.
O processo de escrita, aliás, era uma questão preocupante e, na opinião de Eunícia, um problema grave na nossa sociedade: “Muitos não conseguem ter um pensamento narrativo muito prolongado, não conseguem pensar mais do que conjuntos de parágrafos, influenciados por essa linguagem nova muito visual, onde há outro processo de interação com quem está lendo e escrevendo. No momento em que o aluno só pode participar da aula através de uma intervenção escrita, ele acaba qualificando o seu pensamento no formato escrito, algo que normalmente não é exigido dele. No espaço de aprendizagem a distância, o aluno é convidado a escrever, tem a intervenção do colega, do professor e, então, pode reescrever. Vejo no processo da escrita a transformação do pensamento e isso é muito bacana porque tenho a materialização desse processo, o que não há, às vezes, no espaço tradicional da sala de aula”.
Na opinião da professora, é uma ilusão acreditar que os alunos já são alfabetizados no mundo virtual: “A maioria chega nas minhas mãos sem habilidade de busca, de pesquisa, de registro, sem noção de como validar uma pesquisa dentro de parâmetros ou critérios acadêmicos. Há uma diferença entre buscar uma receita de um doce na internet e saber produzir material acadêmico, com validação institucional, que será acessado por outras pessoas e que possa efetivamente sustentar a produção de conhecimento. Utilizo, então, o ambiente para trabalhar essas questões, afinal, tenho preocupações com a formação deles. Serão futuros professores e pesquisadores na área de História. É preciso saber usar o ambiente virtual de forma acadêmica, problematizando o conhecimento, isso faz com que os alunos sejam um pouco mais desconfiados com relação aos recursos tecnológicos que temos hoje. Eles começam a ficar mais sagazes ao lidar com outras coisas, o que eu acho bem importante também.
Matemática: do presencial para o virtual
O ensino semipresencial ou a distância tem sido muito discutido e na PUC-Rio este modelo foi implementado em diferentes disciplinas; uma delas é a matéria “Cálculo de uma variável”, ministrada pela professora Cristiane Pinho Guedes, conhecida como professora Kity, do Departamento de Matemática da universidade. Na 6ª edição da revista Asas, ela conversou com nossa equipe e contou como foi desenvolver e produzir vídeos para sua disciplina.
A disciplina Cálculo de uma variável é dividida em duas partes, uma teórica e uma computacional. Nesta segunda parte, as aulas ocorrem em laboratório com a utilização do Maple, um software de computação simbólica que auxilia em diversas atividades de matemática.
Como muitos alunos têm dificuldade em usar o Maple, a professora Kity fez os primeiros vídeos caseiros com objetivo de auxiliar a utilização do software para uma turma presencial. O resultado foi surpreendente e já no segundo semestre de utilização dos vídeos, havia uma quantidade muito grande de visualizações.
“As filmagens foram feitas com aplicativos de captura de tela (Camtasia), onde o software Maple era apresentado ao mesmo tempo que o conteúdo teórico era explicado ao aluno. Os alunos diziam que aquilo estava ajudando muito na compreensão da matéria. Chegamos a pensar que poderia haver uma evasão da sala de aula já que os vídeos estavam disponíveis, mas isto não aconteceu”, lembra a professora Kity.
Com o bom retorno dos vídeos de apoio ao Maple, o Departamento de Matemática partiu para uma nova etapa: oferecer a disciplina de Cálculo de uma variável no formato semipresencial onde a parte teórica continuaria presencial, mas a parte computacional seria completamente a distância, aproveitando os vídeos que já estavam prontos, além do material desenvolvido nos semestres anteriores na plataforma Moodle disponibilizado na página do CCEAD.
Na opinião da professora Kity, o aluno precisa ter uma maturidade muito grande para realizar um curso a distância, além de ter disciplina rigorosa para respeitar o cronograma estabelecido: “Esta não é uma opção para qualquer um. Acho que calouros desta disciplina de Cálculo não devem fazer uma disciplina a distância, por exemplo; eles têm que estar em sala de aula. Mas a modalidade a distância é excelente para alunos com tempo limitado porque trabalham ou aqueles transferidos de outras universidades que já cursaram a matéria, mas não conseguiram isenção na PUC. Há ainda os alunos reprovados que enxergam no curso a distância uma alternativa interessante”, avalia a professora.
A terceira etapa do projeto do Departamento de Matemática foi oferecer a disciplina de Cálculo no formato semipresencial mas agora envolvendo tanto a parte teórica quanto a computacional. Das oito horas previstas na carga horária, foram mantidos encontros de duas horas semanais presenciais, sendo as seis horas restantes a distância. Para que o objetivo fosse alcançado com sucesso seria necessário realizar gravações não só do Maple, mas do conteúdo teórico. Com o apoio do decanato do CTC e do departamento de comunicação, a professora Kity iniciou a gravação das primeiras aulas de cálculo no estúdio de filmagem do departamento de comunicação.
Os primeiros vídeos foram disponibilizados a todos os alunos, inclusive das turmas presenciais, com boa recepção. A turma a distância tinha vinte alunos, mas os acessos dos vídeos chegavam a cem. Vários estudantes dos cursos presenciais também usavam o material, afirmando que era um reforço para as aulas. Para eles, foi mais uma ferramenta para auxiliá-los na aquisição do conhecimento.
Menos reprovações entre estudantes de Engenharia Química
André Pimentel, professor da disciplina Físico-Química do curso de Engenharia Química, começou a utilizar o ambiente virtual de aprendizagem em 2012 e percebeu que as turmas apresentaram um desempenho muito superior depois da adoção do software como parte de um novo método pedagógico. Na 5ª edição da revista Asas, ele explicou as várias formas de utilizar as tecnologias como apoio ao processo de ensino-aprendizagem: “Utilizo o Moodle de diferentes formas. Por exemplo, faço enquetes sobre os temas trabalhados em aula e de acordo com as respostas, preparo exercícios visando a melhoria do aprendizado. Os testes virtuais funcionam da mesma forma. Após as aulas, os alunos realizam testes não para ter mais disciplina ou para obter nota, mas para avaliar o que aprenderam em sala. Assim, são capazes de saber onde há dificuldades; podem repetir o teste várias vezes até sentir que dominam bem o conteúdo. É um excelente auxílio para eles”, explica o professor.
As pesquisas de avaliação também foram bastante utilizadas, pois permitiam que o professor conhecesse as características de cada aluno e da turma como um todo. Eram doze perguntas de múltipla escolha, cujas respostas levavam a informações importantes. O professor Pimentel explicou que a aula era organizada de acordo com os resultados da avaliação: “Consigo saber se a turma tem um raciocínio lógico ou se absorveu o conteúdo da aula. Posso até fazer uma autoavaliação com as opiniões em relação a mim, ao curso e ao conteúdo. Dessa forma, tenho um feedback permanente dos alunos e vou adaptando a aula a partir disso. É comum que os alunos sintam vergonha de fazer perguntas em sala de aula porque não querem mostrar suas dificuldades, mas com esse feedback eu preparo minhas aulas e consigo excelentes resultados”.
O professor André Pimentel afirmou em sua entrevista saber que o uso do Moodle ia além de simplesmente colocar material em um ambiente virtual. Ele contou que teve um grande trabalho inicial para arrumar tudo, mas sempre soube que não bastaria lançar slides, testes e exercícios e deixar que os alunos navegassem por conta própria: “Professor que faz isso está enganado”, disse. O segredo, revelou, é investir em testes simples e de múltipla escolha que fornecem dados estatísticos, importantes para ter o feedback da turma e, assim, adaptar as aulas. Os resultados aparecem nos gráficos de avaliação e também no rendimento da turma.