Em 2009, um grupo de radialistas, músicos, técnicos e professores aceitou o desafio de transformar conteúdos que envolvem esta ciência em algo fascinante para os estudantes. Assim nascia o Almanaque Sonoro de Química.
Para entender como tudo começou é preciso voltar um pouco no tempo e ir até 2007, quando o Ministério da Educação cria o Condigital, um projeto que tem como meta a produção de conteúdos educacionais digitais multimídia (audiovisual, áudio, simulações, animações e museu virtual) voltados para o Ensino Médio.
A PUC-Rio foi uma das instituições escolhidas para conceber os produtos de química e Claudio Perpetuo, Coordenador de Criação e Desenvolvimento da CCEAD PUC-Rio, assumiu a tarefa de conduzir o projeto de áudio. “Naquela época, reencontrei um amigo antigo, o Guto Goffi. Comentei sobre o Condigital, ele ficou super interessado e me ajudou a reunir os profissionais que iriam ajudar a transformar as nossas ideias em algo real, concreto”, explica Perpetuo.
Além de Claudio Perpetuo e Guto Goffi, baterista do Barão Vermelho, participaram do projeto Amaury Santos, locutor da rádio MEC, Luiz Santoro, radialista e jornalista, Francisco Barbosa, apresentador da Rádio Tupi, Luciano Lopes e Claudio Gurgel, músicos e responsáveis pela parte técnica, entre outros.
Foram doze meses de muito trabalho. Felizmente, o reconhecimento ocorreu da melhor maneira possível: na avaliação do MEC, o Almanaque Sonoro de Química recebeu pontuação máxima e várias escolas já estão utilizando o material produzido.
Reunidos na sala da casa de Guto, o grupo recordou o início do trabalho e relembrou histórias vividas ao longo de um ano de
intensas atividades.
Convidamos você a participar deste bate-papo e descobrir que a fórmula para se fazer um bom programa de rádio está nos corações (e nas vozes) de quem prepara a receita.
Luiz Santoro – Nós todos ficamos fascinados pelo projeto e entendemos, imediatamente, que poderíamos colaborar com o ensino de química do Ensino Médio. Desde o início, ficou claro que não daríamos aula, inclusive, esta era uma exigência do edital. O que fizemos foi criar “boas histórias” para despertar nos alunos o interesse pela química. E isso nos deu um prazer enorme.
Amaury Santos – Foi nesta mesma sala, onde estamos conversando agora, que nos reunimos para discutir as ideias e foi sugerido o formato de rádio-revista. O Perpetuo lembrou bem que o rádio é o elemento 88 da Tabela Periódica, daí surgiu a ideia da “88. A rádio que irradia a química do dia a dia”. Quem escutar o programa vai reparar que todos os nomes têm um significado, por exemplo, o apresentador Áureo Prata, o professor Hélio, o Darcy Licio (Silício), o perito Berílio e assim por diante.
Francisco Barbosa – Estávamos tranquilos porque sabíamos que havia grandes profissionais trabalhando conosco. Além do Santoro, que é formado em química e nos ajudou bastante, havia também o Amaury, colaborando com a parte pedagógica. Além disso, os músicos eram muito criativos e o Perpetuo, trabalhando também como roteirista, captou a linguagem do rádio e conseguiu inovar para este formato. Transformamos o quimiquês em linguagem de rua.
Claudio Perpetuo – Quebramos paradigmas, usamos a ideia dos festivais com estrelas da MPB na rádio educativa, fizemos repentes, hip-hop, rádio-novela de suspense, programas de auditório; o mais bacana de todo este processo foi a “química” entre os participantes da equipe. Foi uma experiência especial e única. Ficávamos ansiosos para nos reunir novamente e dar continuidade ao trabalho.
Luiz Santoro – Isso é importante enfatizar: havia pessoas renomadas participando do projeto. Além da equipe permanente, também participaram Cleyton e Cledir, George Israel, Marcos Palmeira, Tony Garrido, Carlos Minc, Marcos Veras, Maurício Manfrini, Simone Molina, Henrique Cazes, Aleh, enfim, pessoas de peso, amigas, que voluntariamente contribuíram para a elaboração do Almanaque Sonoro. Claro que deu trabalho acertar o ritmo, afinal, estávamos buscando um dinamismo típico de rádio.
Guto Goffi – No início, nós, da equipe musical, achamos estranha a orientação dos radialistas na hora da edição; eles estavam sempre pedindo para cortar e colar nossas trilhas, sonoplastias, baixar os volumes e por aí vai. Não demorou para percebermos que existe um timing e ritmo próprios no formato radiofônico. Foi preciso fazer esta adaptação e tudo deu muito certo. Luciano Lopes – Vale ressaltar que esse timing dos programas de rádio, de curta duração, foi fundamental; tem a ver com arquivos de áudio a serem disponibilizados na web. A ideia é que possam ser baixados a qualquer momento para uso em diferentes formatos (celulares, ipods, laptops etc.).
Amaury Santos – Isso é que é o mais interessante: o rádio virou formato sonoro, se desvinculou daquela caixinha e hoje é ouvido através da internet, do celular… Nunca se ouviu tanto rádio e música como se escuta hoje. E nem sempre no rádio, o que é bastante curioso.
Guto Goffi – Isso mesmo! E apesar do nosso programa ter esta característica moderna e poder ser acessado a partir de qualquer lugar, a qualquer hora, ele mantém a alma do rádio antigo, te permite imaginar. Lembro da maravilha que era escutar a narração dos jogos de futebol. Tempos depois, quando passei a assistir aos jogos, percebi que grande parte da beleza estava no que o locutor ilustrava.
Francisco Barbosa – É verdade. O rádio nos faz sonhar. Ao contar uma história no rádio, esta história tem as cores de quem ouve. Você imagina da melhor ou da pior maneira possível cada episódio, você consegue ver os personagens. Melhor do que enxergar a história é enxergar a sua melhor história.
Francisco Barbosa – Confesso que achava química uma chatice. Depois dessa experiência, me apaixonei por esta ciência e posso dizer isso em nome de todos nós. Sem dúvida, a maneira de trabalhar o conhecimento, hoje, tem que ser mais interessante; acredito que o Condigital permitiu uma excelente contribuição neste sentido.
Luiz Santoro – Imagina isso numa sala de aula! Permite ao professor trabalhar sua aula de uma forma ainda mais interessante, motivadora para o aluno.
Luciano Lopes – Essa ideia de haver química por todo o lado fica bem evidente no Almanaque Sonoro; ele foi dividido em temas (lixo, combustíveis, cosméticos etc.), e, dessa forma, os programas se aproximaram da realidade e do dia a dia de todos.
Claudio Perpetuo – Além disso, é importante dizer que não há nenhum conteúdo para ser decorado. Criamos quadros, personagens e situações que mostram para o aluno como a química está presente e pode ser aplicada no seu cotidiano. Também achamos
que seria fundamental mostrar que o Brasil é um bom exemplo para o mundo. Somos referência em estudos sobre o genoma, nos destacamos em bioquímica, cosméticos, embalagens, agricultura, combustíveis renováveis e por aí vai. Nesse sentido, fizemos uma ponte entre o Ensino Médio e o mercado de trabalho e investimos em recursos capazes de dar aos ouvintes meios para uma aprendizagem significativa. No Almanaque Sonoro fica claro (em alto e bom som) que todo aprendizado pode ser prazeroso e divertido.
Amaury Santos – Também é legal lembrarmos que aconteceram algumas “intervenções” divinas ao longo deste trabalho. Por exemplo, a participação do Claudio Gurgel, convidado para trabalhar como músico. Descobrimos que ele é neto do Amaral Gurgel, um dos maiores novelistas de rádio que o Brasil já teve. Toda a equipe do Almanaque Sonoro, e em especial, os professores e conteudistas que nele trabalharam, entende que este trabalho precisa de divulgação. Pensando nisso, Claudio Perpetuo criou um espaço na internet onde os programas estão disponíveis para professores, alunos e qualquer pessoa que queira conhecer o trabalho.
O endereço é: http://www.almanaquesonoro.com.br/quimica O site já foi acessado por várias pessoas em Portugal, Estados Unidos, Itália e até na China, além do Brasil, é claro, onde os acessos crescem diariamente.
Os participantes deste trabalho se sentem gratificados e torcem para que esta não seja uma experiência isolada, mas o ponto de partida para uma revolução sonora em favor da educação e do ensino de Ciências no Brasil.