Matemática virtual
O professor Sinésio Pesco conta como foi a experiência de ensinar Cálculo a distância

No segundo semestre de 2011, o coordenador de graduação do Departamento de Matemática, Sinésio Pesco, aceitou o desafio de implantar aulas a distância na disciplina Cálculo I, obedecendo a portaria número 4.059/2004, que permite às
universidades ofertarem até 20% dos cursos presenciais na modalidade a distância.
Nesta entrevista, o professor Sinésio explica como foi a experiência e enfatiza que deu apenas
um pequeno passo na área de EAD, mas o trabalho realizado servirá como base para o
desenvolvimento de projetos maiores e mais ambiciosos no futuro.
Como surgiu a ideia de oferecer aos alunos aulas a distância?
Já existia por parte do Decanato do Centro Técnico Científico certa cobrança para ampliar o uso da educação a distância nos departamentos e unidades vinculados. Quando esta informação chegou até mim, percebi que poderia tentar algo novo envolvendo Cálculo I, que faz parte do ciclo básico da Engenharia. Esta é uma disciplina de alta qualidade, com uma avaliação classificadora. Somos realmente muito exigentes e por isso mesmo há um número grande de alunos que ficam reprovados. Tive a ideia de trabalhar com eles. Então, conversei com alguns colegas e fiquei sabendo que já existiam cursos oferecendo disciplinas na modalidade a distância.
Quais foram os primeiros passos para realizar este projeto?
É importante dizer que não foi sequer um projeto, foi uma experiência. Digo que estou ainda na fase pré-educação a distância. De qualquer forma, nosso primeiro passo foi contactar a CCEAD. Ouvia falar de produção de vídeos, mas durante o desenvolvimento do trabalho percebi que isto não é o mais importante; de fato, é até ultrapassado pensar apenas na ferramenta a ser usada sem pensar em como usá-la. O mais importante é atrair os alunos. A prioridade, então, foi tentar perceber se havia mesmo interesse dos estudantes em participar das aulas a distância e, nesse caso, como estabelecer o diálogo com eles. Focamos na mobilização dos alunos e adotamos a plataforma Moodle, que é fácil de usar, popular, gratuita e dispõe de ferramentas simples e elaboradas, ou seja, há várias formas de usá-la. É algo muito bem pensado.
Na prática, a experiência saiu como você esperava?
Minha esposa trabalha com educação a distância, então, eu já sabia alguns dos desafios, mas aprendi muito quando coloquei o curso para funcionar. Minha experiência ainda é pequena e nem posso afirmar que o curso de Cálculo I foi feito parcialmente a distância, porque não foi. Na verdade, ele é dividido em duas partes: uma teórica, com quatro horas semanais, bastante pesada, e uma prática, realizada em laboratório computacional. Foi esta parte prática que oferecemos na modalidade a distância e descobri que há muito mais a ser explorado do que eu imaginava.
E como foi o processo de transferir as aulas de laboratório para o mundo virtual?
Nas aulas de laboratório usamos um software chamado Maple, que é um software de computação simbólica que auxilia em diversas atividades de matemática. É bastante didático e atende nossas necessidades. Porém, os veteranos que são reprovados em Cálculo I e precisam repetir a matéria não usam tanto o software, ficam desanimados. Pensei em elaborar aulas voltadas para estes alunos, além dos alunos novos. Busquei uma metodologia que acolhesse ambos os grupos. Primeiro, coloquei o material que já usava em sala de aula, mas decidi preparar avaliações semanais simples, feitas no Moodle, que valiam pontos. Na primeira semana, de 200 alunos – calouros e veteranos – 180 entraram no ambiente e fizeram os exercícios, até mesmo aqueles que não costumavam usar o Maple. Imagino que muitos fizeram o exercício apenas para ganhar o ponto, mas não interessa o motivo, eles estudaram e para mim, isso foi o mais importante.
As aulas seguintes foram preparadas com o material usado nas aulas presenciais?
Não, de forma alguma. Descobri rapidamente que não basta preparar o material, lançar no ambiente virtual e acreditar que assim o curso estará pronto. Isso é um mito. O aluno do outro lado da tela está muito ligado ao professor e percebe se há ou não mobilização do docente. Posso até dizer que o aluno fica vigiando o que fazemos, por isso, é fundamental fazer atualizações constantemente. Neste aspecto, o Moodle é excelente, pois possui ferramentas que forçam a interação; temos simplesmente que buscar estas ferramentas. Percebi que havia alunos entrando no ambiente do curso duas e três vezes por dia só para ver o que estava acontecendo, da mesma forma como fazem com o Facebook. Então, pensei em aproveitar esse interesse deles para criar uma movimentação.
Como foi esta movimentação?
Fiz algumas experiências. Primeiramente, inaugurei um quadro de avisos e informei que na véspera da prova abriria um chat. Sabia que na noite anterior à avaliação, todos estariam em casa, estudando. Curiosamente, a prova aconteceria após um feriado e achei que existia a possibilidade de ninguém ler a nota no quadro de avisos. Mas tivemos uma mobilização significativa. Quando marcamos um horário na universidade para tirar dúvidas, aparecem dois ou três alunos; virtualmente, tivemos cerca de quinze alunos participando da conversa. Foi uma loucura porque precisei de dois professores me auxiliando e, ainda assim, tive dificuldades para responder a todos. É preciso muito dinamismo para fazer uma atividade destas e precisaremos repensar a organização no futuro.
Mas soube depois que muitos alunos não entraram no ambiente, mas estudaram com mais tranquilidade porque poderiam conversar com os professores se fosse necessário. O chat deveria funcionar das 20h às 21h e durou até às 23h.
Que outras atividades você criou?
Fiz um simulado no ambiente virtual com as mesmas características da prova presencial, o que incluiu até limite de tempo. Assim que os alunos terminavam recebiam o gabarito. Foi um simulado adaptado para o Moodle, mas houve uma enorme mobilização por parte dos alunos.
Quais foram as vantagens e as desvantagens de trabalhar em EAD?
Há muitas vantagens. Por exemplo, os alunos ficaram muito animados e os veteranos que estavam repetindo a disciplina se sentiram atraídos e participaram bastante. Eles conseguiram se desprender do estigma do mau aluno. Além disso, o Moodle tem o apelo do Facebook. Veja bem, é diferente, mas o que quero dizer é que é uma atividade em comunidade e existe uma atração, precisamos apenas saber como trabalhar isso.
Por outro lado, aproveitando o exemplo do chat, os professores que me auxiliaram não eram do quadro principal e precisei contar com a colaboração deles nessa primeira experiência. Como disse, o chat durou até onze da noite. O problema é que isto não estava previsto. Além disso, quando faço um convite aberto, crio um constrangimento porque os professores não sabem se podem recusar. Assim, essa atividade deve estar prevista dentro da carga horária do professor.
Depois desta experiência, sua visão sobre educação a distância mudou?
Com certeza. Estou acabando com os fantasmas que existem sobre educação a distância. Hoje sei que precisamos pensar na parte tecnológica, mas isto não é o mais importante. Prioridade é focar no relacionamento entre professor e aluno, investir no conteúdo, capacitar o professor, ser criativo e organizado, e o mais importante: estar próximo ao aluno. Por exemplo, no final do semestre eu já estava um pouco cansado e diminuí meu ritmo de trabalho. Isso foi imediatamente percebido pelos alunos e os resultados no ambiente caíram.
Trabalhar com EAD exige a formação de uma equipe voltada para isso. Arrisco a dizer que o tempo que se gasta na modalidade a distância é maior do que o tempo que se gasta no presencial. Não basta preparar o material, é preciso dinamismo e é preciso fazer o aluno perceber que não está sozinho. A educação a distância não pode ser estática e exige interação e apoio constantes. O normal do aluno é aguardar a movimentação do professor e isso acontece também no ambiente virtual.
Quais são os planos para o futuro?
Esta foi apenas uma experiência, um teste. Dei um pequeno passo, por isso mesmo não houve muita divulgação. Não posso dizer que tenho um produto pronto para oferecer, preciso desenvolver isso melhor e, quando isso acontecer, vou elaborar um projeto para abrir uma sigla a distância. Então, poderei fazer uma divulgação de verdade. Minha intenção é que isto ocorra em 2013.
Gosto de deixar isso claro porque o curso de Cálculo é sensível, assusta muito os alunos e não posso arriscar com ele. É preciso saber onde estou pisando. É possível fazer este curso a distância, mas é preciso descobrir exatamente como.
O plano seguinte seria oferecer todo o pacote do ciclo básico, que é nosso ponto forte, a distância. Assim, alunos que estão longe poderiam fazer estas disciplinas sem estar efetivamente na PUC. Depois, eles viriam para cá para fazer a parte mais pesada do curso. Em outras palavras, significa dizer que poderíamos oferecer três semestres importantes, de forma não presencial, respeitando a legislação que permite que até 20% dos cursos sejam oferecidos a distância. Os alunos que estão longe e querem dar o primeiro passo, poderiam fazê-lo antes de se mudar para o Rio de Janeiro. Mas por enquanto isso é só um sonho que aparece nas conversas do departamento.